Corretor faz a ponte entre o varejo e a industria
17 de outubro de 2007
O "broker", ou corretor, figura comum em mercados como o financeiro e imobiliário, começa a ganhar espaço no varejo de bens de consumo para fazer o meio de campo entre a indústria e as redes de supermercados. Na prática, trata-se de uma diversificação de atividade do tradicional distribuidor. Ou de uma volta de ex-atacadistas ao setor, agora sob novo formato, como o mineiro Sindi Logística.
Quem se torna "broker" assume o papel de representante comercial da indústria para atender varejistas de menor porte - aqueles que contam com apenas um a cinco caixas. Pelo conceito, em vez de simplesmente comprar de fornecedores, estocar, vender e distribuir - como o distribuidor tradicional - o corretor visita supermercadistas, anota os pedidos e, depois, encarrega-se da distribuição. E não tem estoques. Em paralelo, cuida do "merchandising" no ponto de venda, com funcionários próprios, treinados pela indústria. Pelo trabalho, ganha, em média, entre 2% e 8% do valor das vendas.
"Não dava mais para continuar apenas comprando da indústria para revender", diz Valdemir Cabrini, da Ponto a Ponto, distribuidora paulista que também virou corretora. Em um ano, a empresa fechou contratos com a Procter & Gamble, Mars (que comercializa os conhecidos confeitos M&M), Barilla, 3M, Ceras Johson e Éffen. Ex-funcionário da Ceras Johnson, Cabriai diz que mudar o conceito ajudou o desempenho da Ponto a Ponto. "Aumentamos o faturamento em 30%", afirma sem, no entanto, revelar os números. Agora, a Ponto a Ponto atende 480 clientes e pretende chegar a 1,9 mil até o ano que vem. Isso porque uma parte da empresa ainda tem atividade de distribuidora convencional e tende a crescer na medida em que a função de "broker" ganhar maior participação.
Fundado em 1962, no norte do Paraná, o grupo Pennacchi acaba de agregar a atividade de corretor. Fechou o primeiro contrato, semana passada, com a empresa de alimentos Nutril, de Belo Horizonte. "Estamos avaliando outras oportunidades, pois acreditamos que é uma modalidade de negócio interessante para o distribuidor", afirma Paulo Hermínio Pennacchi, diretor do grupo que tem negócios no varejo (supermercado) e na indústria (fábrica de balas). Segundo Pennacchi, ainda é difícil medir o quanto a sua empresa de atacado, também com o nome de Pennacchi, poderá crescer. As vendas, de R$ 103,5 milhões no ano passado, podem até dobrar. "Há muito espaço para expandir nesse mercado", diz.
Tanto é que o norte-americano Advantage Sales & Marketing, com vendas anuais de S$25 bilhões, 72 escritórios e mil empregados, estuda aportar no Brasil. Executivos do grupo estiveram por aqui duas vezes farejando oportunidades de negócios. A empresa atende a clientes como Unilever, Colgate, Jonhson & Jonhson e Conagra. Em muitas situações, é responsável por 100% das vendas nos Estados Unidos. Mas, lá, os "brokers" não executam a distribuição das mercadorias. No Brasil, ao contrário, eles acumulam a função de operador logístico. E, por vezes, assumem o risco da inadimplência do comprador, mas se livram dos estoques, uma vez que não compram para revender.
O surgimento do "broker" tem um ingrediente precioso: redução entre 7% e 10% - as vezes até mais - no preço dos produtos. A queda ocorre basicamente por conta da diminuição na carga tributária. Quando a indústria vende por meio do corretor, a nota fiscal é emitida pela própria indústria diretamente ao varejista. A indústria recolhe taxas como Cofins (3,4%), PIS (0,65%), acrescidas da diferença de ICMS sobre PIS e Cofins. Quando a indústria vende diretamente para o distribuidor ou atacadista, este tem de emitir uma nova nota fiscal na venda ao varejo, com as mesmas taxas e impostos. Há, portanto, uma bitributação que não ocorre quando o intermediário é o corretor.
Melitta, Garoto, Nutril e Chapecó são outras companhias que também embarcaram na onda importada dos Estados Unidos e adaptada ao mercado brasileiro. De diferentes ramos de atuação, o que essas empresas buscam é aumentar o canal de distribuição. Querem colocar mais mercadorias nas gôndolas dos 600 mil pontos de venda existentes no Brasil - da birosca da esquina ao hipermercado. Afinal, com a concentração do varejo - as cinco grandes cadeias do varejo responderam no ano passado por 40% dos R$ 67 bilhões faturados pelo setor - a conhecida queda de braço entre indústria e supermercadistas acirrou-se ainda mais. Recorde-se o recente episódio no qual as lojas do Pão de Açúcar ficaram sem os refrigerados da Nestlé por falta de acerto nas negociações.
Gigante de bens de consumo, com vendas de US$ 450 milhões, a Procter & Gamble ainda está testando o novo conceito, a começar por São Paulo. Segundo a empresa, o apelo de redução de preços das mercadorias torna a alternativa atraente. O multinacional, a Melitta, fechou contrato com quatro "brokers" e já comemora ganhos. "Aumentamos em 30% as nossas vendas, de R$ 200 milhões no ano passado", diz Justino Salguero, diretor comercial da Melitta. Ele conta que, além de atingir mais pontos de venda, o corretor consegue comercializar maior volume de itens da linha de produto. "A diferença é que o 'broker' é um representante exclusivo da indústria." Ao fechar um contrato com o fornecedor, o corretor não comercializa produtos das concorrentes. Em média, trabalha com cinco empresas. Os atacadistas operam com marcas de várias empresas, inclusive competidoras, oferecendo mais de dez mil itens.
Segundo Salguero, a Melitta conseguiu dobrar para oito mil o número de clientes de pequeno porte, com até 5 check-outs. Hoje, os "brokers" são responsáveis por 15% das vendas. Isso porque a empresa conta com a parceria apenas para a região Sul, mas poderá ampliar. Os quatro corretores com os quais opera - Ofertão, Auvergne (RS), Tozzo e Companhia (SC) e Luciana's (PR) - começaram como distribuidores.
A adesão mostra que ser um corretor é um negócio interessante tanto para indústria quanto para os distribuidores. Nos Estados Unidos, os "brokers" existem há mais de 20 anos e já respondem por 60% das vendas da indústria para o varejo, segundo Nelson Barrizzelli, consultor e também professor da USP. "O setor atacadista, não apenas o de distribuição, está se reinventado", afirma o consultor Alberto Serrentino, da Gouvêa de Souza & MD. "Com a estabilização, o foco está voltado para oferecer serviço e não apenas para vender mercadorias." Como exemplo, cita o Martins, maior atacadista do Brasil, que passou a atuar no varejo. Fechou parceria com o Jerônimo Marfins, dono do Sá, para abrir supermercados com essa bandeira em Minas Gerais.